Tiroteio (parte 2) 0 611

Postado por Marco Antonio

Coitado. Está sozinho se escondendo por trás das casas. Como se os moradores da cidade tivessem algo a ver com a nossa questão. Seus companheiros sumiram, mas todos sempre somem na hora da dificuldade. Não me surpreende que ele revide nossos ataques, mas me surpreende pensar que me flagro imaginando que passe pela cabeça do jovenzinho ali que ele vá sair dessa se atirar mais e mais, e se fugir mais e mais, e se roubar as granadas dos homens que caíram. A munição dele vai acabar em breve, e é basicamente esperar o que precisamos fazer. E é na verdade isto o que fazemos.

Comando a tropa, e posso dizer que vejo lá longe um homem corajoso que nos combate. Quer dizer, combate não é exatamente o termo que define o que eu vejo, nessa situação de 10 contra 1. Ninguém está nos combatendo agora. Só o que vejo é um jovem adiando o próprio massacre. Se eu souber algo sobre a definição da idéia de massacre, a cena que assisto ilustra meu pensamento. O que posso fazer, além de registrar estes pensamentos enquanto espero, é rezar pela alma do jovem, porque em poucos minutos seu sangue vai regar o chão. Pedirei para meus homens que mirem na cabeça, que a dor vai ser menor, e minha consciência vai pesar menos, se assim o for. Como se a minha consciência tivesse alguma importância. Como se a minha consciência já tivesse tido alguma.

Um brinde ao jovem, ou por extensão, um brinde aos corajosos. Que nem sempre são os mais espertos, corretos ou astutos, mas que guardam no ímpeto da ação um certo que de romance e nobreza que nos falta quase sempre.

Ninguém merece beijos. (2)

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Distante das Linhas de Nazca 0 1269

Thiago Orlando Monteiro

Alguns vazios aumentam sempre que tentamos preenchê-los. E geralmente, porque tentamos preencher com algo que não nos cabe, ou no mínimo não nos pertence.

Não há muito que se ver aqui em cima. Menos ainda há o que se orgulhar. O cinzeiro está transbordando de cigarros. Por cima da mesa são quatro maços vazios e mais um pela metade. Tem outro vazio que não dá pra ver, embaixo do sofá, mas isso é sobre outro dia. As latinhas de cerveja entulhavam a mesa de centro até agora pouco, agora só restam sete, as outras estão sobre a pia. São quatro e meia da manhã, não há mais tempo de se arrepender de nada.

O fluxo de ideias vem numa vertente capaz de mudar o curso de um rio. São dois furacões que espalham tudo o que acabaram de criar. Instantes após o caos a calmaria tenta se fazer presente. Mas não. Esse tipo de sentimento não é bem-vindo, não agora. O cartão de crédito transforma a pequena montanha em linhas. Tudo começa novamente. E só acaba um grama depois.

Nossos impulsos ruem nossa integridade. E como costuma acontecer, ruínas geram ruínas.

O nascimento do sol enfim consegue barrar o curso desse desastre natural. A sensatez, rara nessas condições, permite que três latas de cerveja descansem na porta da geladeira. Um banho quente ajuda a relaxar o corpo. Mas agora, nada é capaz de parar a mente. Já debaixo do lençol o coração bate como uma britadeira. O medo da vida toma conta outra vez. É curioso como tudo sempre lembra o seu contrário. Minha maior vontade era de não estar aqui. Perto de tudo o que me corrói e tão distante das linhas de Nazca.

Escrito pelo Gabriel Protski

Ilustrado pelo Tho

Carta a Hunter S. Thompson 0 1202

A temporada de futebol americano ainda não acabou. Ainda faltam bombas. Faltam andanças. Faltam confusões. Ainda falta muita diversão. Que venham mais 67. Mais 17. Que apenas venham. Mesmo que doa. Mesmo que canse. Mesmo que seja obrigado a conviver com o gosto de cloro. Talvez isso não seja plano para mais ninguém. Não importa. Que sigam os jogos, a temporada está só começando.

 


 

Carta de suicídio de Hunter S. Thompson:

“A temporada de futebol americano acabou.

Chega de jogos. Chega de bombas. Chega de andanças. Chega de natação. 67 anos. São 17 acima dos 50. 17 mais dos que necessitava ou queria. Aborrecido. Sempre grunhindo. Isso não é plano, para ninguém. 67. Estás ficando avarento. Mostra tua idade. Relaxe. Não doerá”

 


 

Gabriel Protski