Na radiola 5 633

Estreando na meia cancha: Karkão.

Aquele dia frio e tedioso com certeza não iria terminar quente e animado. Nem adiantava esperar por isso, era óbvio que não aconteceria. A emoção e a aventura não passavam por sua vida há muito tempo – exceto um assalto que sofrera uns dias antes – e lhe parecia elementar que sua única opção para a noite era sentar e assistir o tempo passar.

Eis que cai em suas mãos um velho exemplar de uma velha revista que costumava ler (não que ela tenha de fato caído de algum lugar, ele estava mesmo procurando algo pra ler porque na verdade quase ninguém fica realmente sentado sem fazer nada por horas).

Botou um velho LP na velha radiola e acabou quase que vivendo uma viagem no tempo.

Nas páginas da revista, encontrava fotos de tempos em que era garoto e freqüentava muito mais o estádio do seu time, que vivia muito mais glórias. Sabia todas as escalações.

Nas caixas de som, gravações que há muito não ouvia, por preguiça de sair da frente do computador para ouvir música. Timbres que lhe recordavam antigos amigos, antigas namoradas. Sabia todas as letras.

Acabou por pegar mais cinco números da revista e ouvindo mais quatro LPs dos tempos da juventude.  Curtiu e viveu aquela noite mais intensamente do que todas as noites do último mês em que tudo que fazia era beber e beber e fracassar em todos os flertes que arriscava, mais por estar bêbado do que propriamente por ser desinteressante ou feio. Lembrou dos tempos em que confiava em si próprio mais que no copo de cerveja, aonde andava se afogando, procurando uma solução.

Dormiu feliz. E decidiu que no dia seguinte iria procurar seus amigos para conversar sobre a vida – e não só pra ter uma companhia com quem encher a cara. E decidiu que voltaria ao estádio de seu time, do qual sentia tanta falta.

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5 Comments

  1. depois de ler o post do querido Rômulo Karkão, só digo uma coisa. Por que caralhos não nos ocorreu chamá-lo antes?

  2. grande karko! parabéns pelo post, guri.
    um pouquinho do estilo de vida de cada um de nós descrito com muita elegância… vou te dar um abraço quando nos encontraarmos no bar do torto! =)

  3. hahahaha….gente…vamos horizontalizar essa coisa. rafael, me pergunte o que eu acho de horizontalização na internet!
    aeaeuhaeuau…

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Distante das Linhas de Nazca 0 1277

Thiago Orlando Monteiro

Alguns vazios aumentam sempre que tentamos preenchê-los. E geralmente, porque tentamos preencher com algo que não nos cabe, ou no mínimo não nos pertence.

Não há muito que se ver aqui em cima. Menos ainda há o que se orgulhar. O cinzeiro está transbordando de cigarros. Por cima da mesa são quatro maços vazios e mais um pela metade. Tem outro vazio que não dá pra ver, embaixo do sofá, mas isso é sobre outro dia. As latinhas de cerveja entulhavam a mesa de centro até agora pouco, agora só restam sete, as outras estão sobre a pia. São quatro e meia da manhã, não há mais tempo de se arrepender de nada.

O fluxo de ideias vem numa vertente capaz de mudar o curso de um rio. São dois furacões que espalham tudo o que acabaram de criar. Instantes após o caos a calmaria tenta se fazer presente. Mas não. Esse tipo de sentimento não é bem-vindo, não agora. O cartão de crédito transforma a pequena montanha em linhas. Tudo começa novamente. E só acaba um grama depois.

Nossos impulsos ruem nossa integridade. E como costuma acontecer, ruínas geram ruínas.

O nascimento do sol enfim consegue barrar o curso desse desastre natural. A sensatez, rara nessas condições, permite que três latas de cerveja descansem na porta da geladeira. Um banho quente ajuda a relaxar o corpo. Mas agora, nada é capaz de parar a mente. Já debaixo do lençol o coração bate como uma britadeira. O medo da vida toma conta outra vez. É curioso como tudo sempre lembra o seu contrário. Minha maior vontade era de não estar aqui. Perto de tudo o que me corrói e tão distante das linhas de Nazca.

Escrito pelo Gabriel Protski

Ilustrado pelo Tho

Carta a Hunter S. Thompson 0 1213

A temporada de futebol americano ainda não acabou. Ainda faltam bombas. Faltam andanças. Faltam confusões. Ainda falta muita diversão. Que venham mais 67. Mais 17. Que apenas venham. Mesmo que doa. Mesmo que canse. Mesmo que seja obrigado a conviver com o gosto de cloro. Talvez isso não seja plano para mais ninguém. Não importa. Que sigam os jogos, a temporada está só começando.

 


 

Carta de suicídio de Hunter S. Thompson:

“A temporada de futebol americano acabou.

Chega de jogos. Chega de bombas. Chega de andanças. Chega de natação. 67 anos. São 17 acima dos 50. 17 mais dos que necessitava ou queria. Aborrecido. Sempre grunhindo. Isso não é plano, para ninguém. 67. Estás ficando avarento. Mostra tua idade. Relaxe. Não doerá”

 


 

Gabriel Protski