postado por Marcola
(É um cara que vai pra cadeia depois de um assalto obviamente mal sucedido empreendido contra uma joalheria. Que se fosse bem sucedido, ele não ia preso.)
E sobre essas coisas como moral da história, motivações legítimas para escrever, respeito pela inteligência da leitora… Todas são idiotices inventadas por algum profissional das palavras, querida. Sou um amador, e por isso me dou o direito de ser babaca gratuitamente. E lanço o desafio. Não que eu queira mesmo te testar ou desafiar. Quem nunca quis ser obscuro ao se expressar, que atire a primeira pedra. Ou que viva um pouco mais intensamente, que a oportunidade vai vir. Você já foi obscura, Alice, se você lembra de tudo tanto quanto eu lembro. Termino esse parágrafo e sem motivo algum começo o próximo, que não é na ordem lógica o próximo, mas na ordem que eu quis dar é sim. 2 – 4 – 1 – 3, e por fim o 5. Eu quero fazer assim. Na sua resposta você faz como preferir, se você me responder um dia. Se eu não estiver mandando a carta para um endereço que você já abandonou há meses por não conseguir arcar com as despesas do lar, como aconteceu em outras ocasiões. E se você quiser responder, claro, no caso de o endereço ser o correto. Você devia arranjar empregos mais rentáveis, Alice, se me for permitido o comentário. Se não for, não foi, mas eu o fiz da mesma maneira, como você sabe que eu faria. Porque é isso que eu faço melhor. (1)
Cheguei aqui há pouco e cumpri minha promessa. Não tenho nada a dizer, e se você tiver tempo ocioso o bastante pra ler o texto inteiro, isso é um sinal do Bom Senhor, com certeza. Não vou pedir desculpas por te roubar um minuto ou dois de atenção. Aliás, já te roubei a atenção outras vezes, de formas igualmente desrespeitosas, Alice querida. No dia do assalto à joalheria, por exemplo. E você roubou-me tempo algumas vezes também, mas esse eu nunca vou te cobrar, porque eu te amo demais pra me preocupar com coisas pequenas como essa de tempo roubado, investido, perdido, usado da melhor maneira que existe. Da única maneira que eu gosto. (2)
Você sabe que eu nunca me ative a bobagens como querer ter “o verdadeiro conhecimento dos fatos” para vomitar minhas opiniões sobre as coisas, e não é agora que vou começar a fazê-lo. Não vejo graça na idéia de ir a fundo em questões com as quais me preocupo pouco. E não é nem só uma questão de não ver graça. Acaba sendo mais uma questão de meramente desprezar o que acho que não vá me levar a lugar algum. Tenho ainda o hábito pueril de acreditar que estou indo para algum lugar, enquanto indivíduo, ou que estamos indo para algum lugar, enquanto casal. Tola criança. Confesso minha inocência, sabendo-me culpado no entanto. Disse você, como se imitasse o Juiz de Direito: “Culpado”. Enfim, o caso é que, sobre o que gosto, sei o bastante. Nunca bastante, mas o suficiente pra que eu possa me iludir sobre saber algo sobre alguma coisa. Nesses dias sombrios de cárcere é bastante necessário. Entende como? Pela manutenção da sanidade?! (3)
É nessa onda de ilusão que eu vou surfando desde que entrei aqui. Entorpecido pelo éter da mentira e da interpretação questionável. Com a minha prancha longboard composta de prepotência, marrentice, falta de respeito, de educação e de bom senso, vou sobrevivendo. Gosto da auto destruição, e recentemente descobri que gosto da auto reconstrução também. Pouco preocupado fico com isso. Mas devia estar muito preocupado, eu sei Alice. Que quando eu ando nos corredores, as paredes me encaram e os outros presos também. (4)
Bem, e quanto à baixa qualidade das metáforas que uso, não peço desculpas. Culpada é você que gasta tempo com elas. Estamos juntos nessa, meu amor. Pelo menos nisso. Não tente se livrar do fardo de sua culpa, que aqui não há perdão. Não nesse labirinto idiota. Nessas horas que não passam. Nessa dor que me amassa o peito. Nessas imagens gastas por poetas mais e menos nobres que eu. Horas que não passam, dores que amassam o peito, labirintos, enfim. É o relógio quebrado, um enfarto, um Minotauro? O que é isso tudo, Alice? Responda-me com o coração. Porque eu perguntei com o coração.(5)
e a citação do dia é:
“…eu duvido que tava legal, porque só é legal quando eu tô lá, que quando eu não tô não tem como eu saber se tava mesmo legal…”