As janelas são os olhos das realidades – umas mais, outras menos 1 655

postado por Rafaé

Depois de muito tempo, ele pôde se entregar novamente aos pequenos prazeres, nem sempre compreendidos pelos outros. Não que sejam coisas que nós, aqui, possamos entender e achar bonito. Mas cá entre nós. Podemos ser indiferentes, ao invés de reprovar.

Caminhando assim, visivelmente inquieto, não se pode saber o que se passa por trás daquela expressão de semi embriaguez e riso contido. Talvez sejam as lembranças daquela mão, despida da luva, que ia e vinha, levando o cigarro àquela boca, até então desconhecida. Aquelas unhas vermelhas desafiavam a autonomia dos seus olhos, que já não compreendiam a realidade fora daquela mesa.

Pouca coisa fez sentido naquela noite. As lembranças não são tão nítidas, apesar de senti-las com um certo prazer, devido à certeza da sinceridade e intensidade daqueles delírios. No dia seguinte, a primeira imagem que conseguiu captar, além da garrafa d’água na geladeira, foi a daqueles olhos que refletiam a realidade além da janela (que não o atraia mais do que aquela cama). A cor daqueles olhos? Não soube definir. Cores não traduziriam o conforto transmitido pelo olhar de quem passou a noite inteira ao seu lado, com suas sinceridades.

Eis que o telefone tocou e a realidade (lá de fora) o chamou. Pronto, chegou a hora de juntar os pedaços da noite e montar versões convincentes…

Previous ArticleNext Article

1 Comment

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Distante das Linhas de Nazca 0 1277

Thiago Orlando Monteiro

Alguns vazios aumentam sempre que tentamos preenchê-los. E geralmente, porque tentamos preencher com algo que não nos cabe, ou no mínimo não nos pertence.

Não há muito que se ver aqui em cima. Menos ainda há o que se orgulhar. O cinzeiro está transbordando de cigarros. Por cima da mesa são quatro maços vazios e mais um pela metade. Tem outro vazio que não dá pra ver, embaixo do sofá, mas isso é sobre outro dia. As latinhas de cerveja entulhavam a mesa de centro até agora pouco, agora só restam sete, as outras estão sobre a pia. São quatro e meia da manhã, não há mais tempo de se arrepender de nada.

O fluxo de ideias vem numa vertente capaz de mudar o curso de um rio. São dois furacões que espalham tudo o que acabaram de criar. Instantes após o caos a calmaria tenta se fazer presente. Mas não. Esse tipo de sentimento não é bem-vindo, não agora. O cartão de crédito transforma a pequena montanha em linhas. Tudo começa novamente. E só acaba um grama depois.

Nossos impulsos ruem nossa integridade. E como costuma acontecer, ruínas geram ruínas.

O nascimento do sol enfim consegue barrar o curso desse desastre natural. A sensatez, rara nessas condições, permite que três latas de cerveja descansem na porta da geladeira. Um banho quente ajuda a relaxar o corpo. Mas agora, nada é capaz de parar a mente. Já debaixo do lençol o coração bate como uma britadeira. O medo da vida toma conta outra vez. É curioso como tudo sempre lembra o seu contrário. Minha maior vontade era de não estar aqui. Perto de tudo o que me corrói e tão distante das linhas de Nazca.

Escrito pelo Gabriel Protski

Ilustrado pelo Tho

Carta a Hunter S. Thompson 0 1213

A temporada de futebol americano ainda não acabou. Ainda faltam bombas. Faltam andanças. Faltam confusões. Ainda falta muita diversão. Que venham mais 67. Mais 17. Que apenas venham. Mesmo que doa. Mesmo que canse. Mesmo que seja obrigado a conviver com o gosto de cloro. Talvez isso não seja plano para mais ninguém. Não importa. Que sigam os jogos, a temporada está só começando.

 


 

Carta de suicídio de Hunter S. Thompson:

“A temporada de futebol americano acabou.

Chega de jogos. Chega de bombas. Chega de andanças. Chega de natação. 67 anos. São 17 acima dos 50. 17 mais dos que necessitava ou queria. Aborrecido. Sempre grunhindo. Isso não é plano, para ninguém. 67. Estás ficando avarento. Mostra tua idade. Relaxe. Não doerá”

 


 

Gabriel Protski