Lunático 2 649

postado por Rômulo, o ressuscitado.

Olhava para a lua como um menino olha para uma menina: atraído e envergonhado. Há anos já mantinha com ela (a lua) essa admiração platônica e apaixonada. Do morro mais alto da província em que morava desde sempre, noite após noite sentava-se ao pé de uma figueira para apreciar a ela, a lua, sempre como quem espera algo.

Naquela noite, rodeado por sons da natureza (um grilo cantando aqui, um roedor rasteiro balançando folhas ali), algo diferente aconteceu. Progressivamente, sentia-se mais leve, menos corporal e mais etéreo. Aos poucos, deixava o pé da árvore e rumava, vagarosamente, ao encontro do astro – a lua -, viajando envolto no negrume da noite. De ruído, apenas o das pancadas ritmadas do sangue que lhe percorria as veias e artérias, cada vez mais intensas.

Leveza e paz de espírito tomaram conta de seu coração. Regozijava-se e entregava-se ao deleite da singular fonte de luz (a lua), que de tão única tornava-se múltipla na visão de tão apaixonado espectador. Queria tocá-la, envolvê-la – menos ansioso que encantado e extasiado. Mas eis que veio o sol, despertando-o daquele sonho, tão real quanto inverossímil.

Pedro- Paulo Paz nunca soube se aquela fantasia sublime havia sido uma ilusão ou se algo de sobrenatural realmente lhe havia acontecido. Levantou-se da figueira e foi – ainda arrebatado – cuidar de seus afazeres diários.

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Distante das Linhas de Nazca 0 1277

Thiago Orlando Monteiro

Alguns vazios aumentam sempre que tentamos preenchê-los. E geralmente, porque tentamos preencher com algo que não nos cabe, ou no mínimo não nos pertence.

Não há muito que se ver aqui em cima. Menos ainda há o que se orgulhar. O cinzeiro está transbordando de cigarros. Por cima da mesa são quatro maços vazios e mais um pela metade. Tem outro vazio que não dá pra ver, embaixo do sofá, mas isso é sobre outro dia. As latinhas de cerveja entulhavam a mesa de centro até agora pouco, agora só restam sete, as outras estão sobre a pia. São quatro e meia da manhã, não há mais tempo de se arrepender de nada.

O fluxo de ideias vem numa vertente capaz de mudar o curso de um rio. São dois furacões que espalham tudo o que acabaram de criar. Instantes após o caos a calmaria tenta se fazer presente. Mas não. Esse tipo de sentimento não é bem-vindo, não agora. O cartão de crédito transforma a pequena montanha em linhas. Tudo começa novamente. E só acaba um grama depois.

Nossos impulsos ruem nossa integridade. E como costuma acontecer, ruínas geram ruínas.

O nascimento do sol enfim consegue barrar o curso desse desastre natural. A sensatez, rara nessas condições, permite que três latas de cerveja descansem na porta da geladeira. Um banho quente ajuda a relaxar o corpo. Mas agora, nada é capaz de parar a mente. Já debaixo do lençol o coração bate como uma britadeira. O medo da vida toma conta outra vez. É curioso como tudo sempre lembra o seu contrário. Minha maior vontade era de não estar aqui. Perto de tudo o que me corrói e tão distante das linhas de Nazca.

Escrito pelo Gabriel Protski

Ilustrado pelo Tho

Carta a Hunter S. Thompson 0 1213

A temporada de futebol americano ainda não acabou. Ainda faltam bombas. Faltam andanças. Faltam confusões. Ainda falta muita diversão. Que venham mais 67. Mais 17. Que apenas venham. Mesmo que doa. Mesmo que canse. Mesmo que seja obrigado a conviver com o gosto de cloro. Talvez isso não seja plano para mais ninguém. Não importa. Que sigam os jogos, a temporada está só começando.

 


 

Carta de suicídio de Hunter S. Thompson:

“A temporada de futebol americano acabou.

Chega de jogos. Chega de bombas. Chega de andanças. Chega de natação. 67 anos. São 17 acima dos 50. 17 mais dos que necessitava ou queria. Aborrecido. Sempre grunhindo. Isso não é plano, para ninguém. 67. Estás ficando avarento. Mostra tua idade. Relaxe. Não doerá”

 


 

Gabriel Protski