Férias em Bombas, Santa Catarina. Estava bom, mas agora não mais.
Mais que sol, só tomei cachaça nesse verão.
Não, pera. Elas não tão ligando o carro. Elas tão indo? E…las…tão……………………in…dem…bo…ra. E eu aqui sozinha olhando pra dois dos meus agora ex-dentes no chão. E eu ainda fui olhar preço de passagenzinha de ônibus pra elas virem pra esse inferno. Tomara que a polícia pare essa porra desse carro roubado daqui um minuto, ali perto daquele negócio em cima, sei lá o que é aquilo. Comércio, enfim. Ou elas podiam bater essa desgraça e morrer, também. Tinham que tomar tiro na cara, as duas, e aí sim bater e explodir. Deve ser difícil ver carro explodir. Carro não explode. Deve ser por isso que explode em filme de ação, porque é mentira. Mas aqui num tem Van Damme, num tem Dragão Branco, Entrevista com o Vampiro, Missão Impossível, Duro de Matar, Transformer, Crepúsculo, Dois Coelhos, Tropa de Elite, jogo voraz, Cidade de Deus, Harry Potter e a Casa do Caralho, nem porra nenhuma.
Acabou. Dentista é caro. Pior que caro: dói com anestesia, sem anestesia, sei lá o que eles usam na injeção. Deviam colocar mais daquele negócio que deixa a boca toda morta em toda anestesia. Micrograma, miligrama, grama, sei lá. Tinha que ter daquilo em quilo, litro. Dentista faz doer. Incomoda, morder a língua e tudo por dentro, e sangra, sangra. Algodão, cospe, água, jato de ar, barulho sinistro. Tô sem dinheiro nem pra voltar pra casa, quanto mais pra dentista. Piada de dentista é meio sem graça. Dentista é meio sem graça. Dentista é dentista, tanto faz. Deve até ter dentista engraçado, mas eles não precisam, porque dentista não é palhaço do Beto Carrero. Nem aí. Não ia voltar pra casa mesmo, nem pagar pra ir no dentista, nem nada. Nem sei que horas tem ônibus, nem quero saber.
Cadê minha filha? Isso eu queria saber.
Era mais legal olhar pros meus dentes fora da boca quando eu tinha cinco ou seis anos e eles caíam, um a um, empurrados pelos novos nascendo. Enrolar um dente de leite mole com fio dental e mexer de leve pros lados, puxar devagar, até a hora que ficar bom de arrancar. Isso é bom. Era bom. Era vida. Era morrer um pouco. Agora não tem nada bom. Tá tudo errado. Cheiro e gosto de sangue na boca cheia de saliva, pinga com limão e dor. Minha cara deve tá ficando preta do tanto de soco que levei do segurança. Um cara desse tamanho batendo em mulher. Num tem mãe não, oh?! Minha boca tá sangrando. Vou vomit…
Respira. Respira. Inaaaaaaaaala. Exaaaaaaaaaaala.
Inara, Inara, Inara, Inaraí…
Tem gente que rouba coisa pior que gelatina e leite condensado e fica solta. Acabou. Não vou fazer minha batida tradicional hoje, e eu juro que queria beber um pouco daquilo. Sem veneninho pra mim. Queria tomar um banho gelado. Não fico presa muito tempo não, pelo menos. Será que os funcionários desse mercado tomam banho na loja? Acho que esse segurança devia perguntar lá dentro, que ele tá fedendo mais que eu. Ó a sirene chegando. Vou apanhar mais um pouco e esperar a polícia sem bagunçar mais nada. Não consigo fugir.
Não tenho força pra lutar com esse Monstro.
Nem queria ter.
Não vou resistir, nunca mais. Pra nada.
Marco Antonio Santos