
Quando a energia elétrica caiu no quarteirão inteiro, deixando o elevador fora de funcionamento, Larissa não pôde deixar de soltar uma risada nervosa. Faltavam quatro minutos para seu pai passar de carro lá embaixo e só deus sabe o quão puto ele fica com atrasos. Ela ia descer de escada pra chegar mais rápido, mas quando saiu pela porta do apartamento – ainda mastigando o último pedaço do pão com manteiga –, viu o elevador parado no seu andar e achou que aquilo seria um presságio de boa sorte.
Ligou pra ele.
– Pai, não vou conseguir chegar aí na frente. Caiu a luz e eu tô presa no elevador.
– Porra, Larissa, por que não saiu mais cedo? Hoje eu não posso chegar atrasado.
– Vai indo, pai. Depois eu dou um jeito, sei lá.
Ela achava foda essa atitude do pai. Ele oferecia carona como um pai dedicado e Larissa aceitava como uma filha agradecida, mas os dois sabiam que ele não se sentia à vontade com aquilo. Se gostavam, mas se incomodavam um pouco. Era apenas a terceira vez que ela se atrasaria, de uns quinze dias úteis consecutivos em que ele passava para buscá-la. Mas, ainda assim, seu Antônio tratou de transformá-la na culpada pela queda da luz na região.
Já uns vinte e cinco minutos ou quarenta quadras depois, sentiu-se, ele, culpado. Lembrou que a filha não gostava de lugar pequeno e imaginou que ela não estaria lá muito feliz presa numa caixa estreita de metal. Encostou e telefonou.
– Filha, como tá aí? O pai pode voltar te pegar.
– Não, pai. Pode ir. Consegui ligar na Copel e o cara disse que nem tem previsão pro conserto terminar. Diz que estourou um transformador. Eu pego um táxi quando sair daqui.
– Porra, mas agora você me deixou preocupado. Como vou trabalhar com você presa aí dentro por deus-sabe-quanto tempo?
Essa atitude ela achou ainda mais foda. Que merda era aquela? Como se ela tivesse entrado de propósito no elevador quebrado, só pra atrapalhar a manhã de seu pai. Logo ela, que detestava lugar pequeno. Larissa sentiu uma certa raiva dele. Novamente, inconscientemente, seu Antônio tratou de tentar transformá-la na responsável pelo péssimo dia de trabalho que ele com certeza teria. Ela cansou.
– Opa, pai, meu chefe mandou mensagem. Disse pra eu não ir hoje, que ele tá doente e a firma não vai abrir. E tô ouvindo barulho aqui, acho que o zelador tá dando um jeito de me tirar do elevador. Pode ir trabalhar tranquilo. Beijo.
Seu Antônio teve uma manhã comum, modorrenta como todas as outras, enquanto Larissa passou mais duas horas e uns poucos minutos suando frio no elevador, além de ter a falta descontada no salário do mês.
Rômulo Candal
Fotografias e montagem: Ulisses Candal Sato
Descobrindo um santo pra cobrir o outro. Muito massa Krk… o Seu Antonio é inspirado no Seu Antonio?? rsrsrs
olha, eu não tinha feito essa relação, mas pode ter a ver! hahaha