
por Murilo, o que vigia os vigilantes.
Josiel é flanelinha, mas não é um flanelinha qualquer. Para que possamos ter ideia das suas competências acima da média para essa profissão, podemos começar citando algumas de suas experiências profissionais.
Para proteger os veículos como poucos, Josiel trabalhou por cinco anos em empresas do setor de segurança. Já foi vigia noturno armado, mas hoje as únicas armas que precisa são as próprias mãos. Isso porque Josiel é graduado em quatro estilos de artes marciais: Tae Kwon Do, Muay Thai, Karatê e Kung Fu no estilo Garra de Águia. Além das garras, da águia ele também tem os olhos vigilantes, sem quaisquer doenças oculares. Mas para ampliar ainda mais sua visão e vigiar até cem carros de um mesmo lugar, Josiel conta com um avançado binóculo do exército americano. “Ladrão aqui não tem vez. Até as periquitas passam longe” diz ele.
Josiel tirou carteira de motorista nas habilitações A,B,C,D e E. Tem, portanto, habilidade comprovada para conduzir e, principalmente, para estacionar de monetas a ônibus biarticulados. Para aperfeiçoar a arte conduzir a baliza de outrem pelas estreitas vagas da cidade, Josiel fez também estágios em renomados vallets Brasil afora. Hoje, girando seus braços e dizendo “vem, vem, vem”, Josiel parece manobrar uma orquestra.
As capacidades de Josiel não param por aí. Para transmitir simpatia e carisma a seus clientes, o flanelinha fez dois anos de artes cênicas, além de cursos de oratória e expressão corporal. Josiel mantém diariamente sua aparência limpa e seu uniforme – um colete com faixas refletivas – impecavelmente asseado. Buscando evitar os clichês dos guardadores, ele jamais usa frases como “Bem cuidado, hein?” ou “Dar uma olhadinha, dotô?”. Quando um cliente estaciona em sua área, prefere dizer algo como “Cuidarei de seu carro como cuido de meus filhos, senhor”. Mas isso é mentira, pois ele não cuida assim tão bem dos filhos.
Josiel não tem tabela de preços e não espera receber mais do que os estacionamentos privados, seus piores concorrentes. Mesmo assim, seu trabalho é valorizado e ele chega a faturar, em média, sessenta reais por dia. Ao contrário da maioria dos cuidadores, Josiel não sai correndo até os carros para pegar seu pagamento. São os clientes que vêm até ele. “Esse respeito é gratificante, mas admito que ainda há um pouco de preconceito. Se é flanelinha as pessoas já acham que é vagabundo. Se tem vaga, tem vagal, dizem. Mas não é sempre assim” desabafa o profissional. Letrado como poucos, faz referência ainda ao termo francês “flâneur”. Diz que apesar da semelhança das palavras, um “flanelinha” de verdade está muito longe de ser um andarilho urbano sem rumo.
Nos próximos meses, Josiel pretende revelar seu lado empreendedor e abrir algumas franquias nas principais ruas da cidade. Mas garante que só contratará pessoal rigorosamente qualificado. Atualmente, se você deseja usufruir dos bons serviços do flanelinha, deve chegar cedo, pois a rua logo atinge lotação.
Foto: Neil. Moralee via Compfight cc