postado por Rafaé.
Era a oitava, talvez décima quinta vez que ia ao parque naquele horário. Sempre assim, de maneira despretensiosa, caminhando sob a luz dourada do fim de tarde outonal. Sabia bem onde ela morava, mas sua vontade era de recriar o primeiro encontro, onde os dois caminhavam sem pressa, nem destino. Sempre gostou de forjar realidades formidáveis.
Adolfo, em seu ócio, construíra toda abordagem (inesperada), diálogo, até o café com creme, durante o qual ele a convidaria para conhecer a sua casa (dele ou dela, tanto faz). Já em casa, declararia toda sua intenção com aquele acaso que os conduzira até ali.
Enfim a luz dourada deu espaço à penumbra, que engolia Adolfo a cada momento. Ainda assim, ele dava mais um tempo, para que a musa tivesse uma chance para o reencontro. Afinal de contas, todo mundo já se atrasou. E ali ficou, até o orvalho criar as primeiras gotas sobre a grama. Desistiu, se sentiu iludido e levantou-se pra ir embora.
Eis que o inesperado aconteceu. Foi tomado de assalto por uma bela jovem que vinha, correndo e jogou-se em seus braços, soluçando. Não, não era sua admirada. Era uma jovem qualquer, que antes que conseguisse falar algo, foi atingida por quatro tiros, disparados por um marido que se dizia traído.
Adolfo não teve tempo de questionar. Talvez, nem tempo para que seu coração disparasse. Apenas ouviu as palavras: “não se meta com esse tipo de piranha!”. E foi só. Não chegou a ouvir o disparo que encaminhou uma única bala ao seu rosto, que permaneceu pasmo sob o mesmo orvalho que embelezava as plantas.
E ali permaneceram os dois. Abraçados, numa bela cena vermelha, digna de uma bela fotografia com os amantes abraçados, rolando pelo chão do amor – exceto pela gélida falta de movimento.
Enfim uma realidade não forjada na vida de Adolfo… ainda que derradeira.
A jovem amada, a qual não fiquei sabendo se existe ou não, nunca mais passou por ali. Talvez tenha ficado amedrontada com uma história assim, tão próxima. Duvido!
Tiro na cara do sonhador em outono atípico.