Decisão do dia: expulsar todas as antigas angústias! 0 704

postado por Rafaé

Em primeiro lugar, quero expor a paixão que me corroi há uns 20 anos. Mariana, lembra de mim? Estudamos juntos na 5ª G, da Escola Tio Lunga. Desde a última vez que te vi, na festa junina daquele ano, nunca mais lhe esqueci. Tenho até hoje a lembrança de você na barraca da pescaria, sem me notar ao seu lado. Acho que você pescou o peixe que valia um sabonete, ou gelatina – não lembro.
Mas o fato é que agora, decidido a me livrar de todas as questões mal resolvidas, venho até aqui, tentando levar minha vontade até você. Não faço a mínima ideia de como você está, mas as lembranças de sua fisionomia, aos 10 anos, me apetecem até hoje. Seria isso um reflexo de pedofilia? Bem, espero que não.
Não sei o porque, mas só agora, anos depois, consigo pensar racionalmente no que aconteceu entre a gente (ou comigo). Você era minha vontade em todos os dias naquela escola. Sempre pensava em como lhe abordar ao final das aulas, e finalmente atar o nosso relacionamento. Ao contrário do resto dos alunos, que torciam pelo tilintrar do sino que simbolizava o fim das aulas, eu me remoia num canto, com calafrios, só de pensar em olhar nos seus olhos e falar coisas simples – que significariam muito.
Sei que isso só parece simples e fácil, por estar falando hoje, sem o uniforme colegial. A racionalidade é sempre assim, simplifica as coisas, mostrando como agir para que funcionem. Mas quero ver alguém que consiga racionalizar suas atitudes, enquanto afogados pela paixão. Eu não consegui e, provavelmente não conseguiria – mesmo após esquematizar tudo, tantas vezes.
Sinceramente, espero que estas palavras cheguem até você. Talvez, minha vontade mesmo é a de falar com a Mariana colegial, não a adulta.

Carinhosamente, seu eterno quase namorado da 5ª série.

ps.: a qualquer momento, mais sentimentos serão despejados.

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Distante das Linhas de Nazca 0 1283

Thiago Orlando Monteiro

Alguns vazios aumentam sempre que tentamos preenchê-los. E geralmente, porque tentamos preencher com algo que não nos cabe, ou no mínimo não nos pertence.

Não há muito que se ver aqui em cima. Menos ainda há o que se orgulhar. O cinzeiro está transbordando de cigarros. Por cima da mesa são quatro maços vazios e mais um pela metade. Tem outro vazio que não dá pra ver, embaixo do sofá, mas isso é sobre outro dia. As latinhas de cerveja entulhavam a mesa de centro até agora pouco, agora só restam sete, as outras estão sobre a pia. São quatro e meia da manhã, não há mais tempo de se arrepender de nada.

O fluxo de ideias vem numa vertente capaz de mudar o curso de um rio. São dois furacões que espalham tudo o que acabaram de criar. Instantes após o caos a calmaria tenta se fazer presente. Mas não. Esse tipo de sentimento não é bem-vindo, não agora. O cartão de crédito transforma a pequena montanha em linhas. Tudo começa novamente. E só acaba um grama depois.

Nossos impulsos ruem nossa integridade. E como costuma acontecer, ruínas geram ruínas.

O nascimento do sol enfim consegue barrar o curso desse desastre natural. A sensatez, rara nessas condições, permite que três latas de cerveja descansem na porta da geladeira. Um banho quente ajuda a relaxar o corpo. Mas agora, nada é capaz de parar a mente. Já debaixo do lençol o coração bate como uma britadeira. O medo da vida toma conta outra vez. É curioso como tudo sempre lembra o seu contrário. Minha maior vontade era de não estar aqui. Perto de tudo o que me corrói e tão distante das linhas de Nazca.

Escrito pelo Gabriel Protski

Ilustrado pelo Tho

Carta a Hunter S. Thompson 0 1217

A temporada de futebol americano ainda não acabou. Ainda faltam bombas. Faltam andanças. Faltam confusões. Ainda falta muita diversão. Que venham mais 67. Mais 17. Que apenas venham. Mesmo que doa. Mesmo que canse. Mesmo que seja obrigado a conviver com o gosto de cloro. Talvez isso não seja plano para mais ninguém. Não importa. Que sigam os jogos, a temporada está só começando.

 


 

Carta de suicídio de Hunter S. Thompson:

“A temporada de futebol americano acabou.

Chega de jogos. Chega de bombas. Chega de andanças. Chega de natação. 67 anos. São 17 acima dos 50. 17 mais dos que necessitava ou queria. Aborrecido. Sempre grunhindo. Isso não é plano, para ninguém. 67. Estás ficando avarento. Mostra tua idade. Relaxe. Não doerá”

 


 

Gabriel Protski